sexta-feira, 21 de novembro de 2014

DESVARIO DAS ESCOLAS DE ELITE 2: A Faculdade de Medicina e os cadáveres insepultos, A CONTROVÉRSIA ENTRE A "QUALIDADE", A CRUELDADE E A IMPUNIDADE!!

Divulgando de YAHOO!Notícias: CRIME/OPRESSÃO/IMPUNIDADE NA FM DA USP!

BLOG DO MATEUS!



A Faculdade de Medicina e os cadáveres insepultos

image
Foto: Fachada da FMUSP/Divulgação
O canal Arte1 exibiu, ontem à noite, o filme Poesia, obra-prima do diretor coreano Lee Chang-Dong. O momento parece propício. Para quem não se lembra ou não conhece, trata-se da história de uma mulher, Mija, que, às portas da velhice, resolve se matricular em um curso de poesia. Para quê?, perguntam à personagem recorrentemente. “Porque gosto de flores e de dizer coisas estranhas”, responde ela, também recorrentemente.
O curso, descobre a personagem, serve para ensiná-la a olhar as coisas ainda não observadas ou observáveis: uma maçã, uma sala de aula, a primeira infância, o rosto da irmã quando criança, as luzes da rua, e a própria rotina, encalacrada num apartamento de subúrbio onde cuida do neto, um jovem desinteressado e desinteressante que denota insolência até quando enche a boca para rir dos programas mais idiotas na tevê.
Envolta em uma vida sem graça e ordinária, Mija não demoraria a fazer coro ao que Manoel de Barros, poeta mato-grossense morto na última semana, dizia sobre a (in)utilidade de se compreender a poesia como tal: “Entender é parede. Procure ser árvore”.
Bem que a personagem tentou, mas a vida real tinha outro recado para ela: a vida não é apenas o embate de olhares, um jogo de colorir luzes foscas a partir do olhar, do artista e da obra de arte. É o embate entre a destruição consentida e a não-consentida. No filme, a vida real, concreta, fosca e de violência latente começa a mostrar os dentes quando descobrimos que aquele menino desinteressado e desinteressante era cúmplice em um caso de estupro coletivo em sua escola.
O crime coloca a avó com um pé em cada mundo. Em um deles, a poesia, como a arte, existia para que a verdade não a destruísse, como preconizava o filósofo Friedrich Nietzsche. Em outro, a verdade, para não ser destruidora, precisava ser ocultada e reinventada. Para isso não havia versos, mas dinheiro, recolhido pelos pais dos outros alunos acusados no crime para calar a família da vítima e salvar a todos, a começar pela reputação da escola. Neste mundo de janelas escancaradas, o dinheiro compra tudo, inclusive o silêncio e a dignidade.
Qualquer semelhança com a vida real não é mera coincidência. No dia em que Manoel de Barros morreu, e com ele um certo desaforo do chão em ser observado de azul, soubemos, pela internet, que o chefe de uma comissão sobre abuso sexual na Faculdade de Medicina da USP, Paulo Saldiva, pedira afastamento do grupo e da universidade. A decisão aconteceu após audiência pública na Assembleia Legislativa paulista em que foram relatados oito casos de violência dentro da USP, entre os quais dois estupros em festas organizadas pelos próprios estudantes, além de inúmeros casos de discriminação racial e sexual. Esse conflito entre imagem revelada e imagem ocultada começou a ser escancarado graças ao trabalho de apuração dos repórteres Igor Ojeda e Tatiana Merlino no coletivo A Ponte (leia mais AQUI)
Na audiência, a faculdade foi acusada de se omitir na apuração dos fatos, relatados desde 2011, para preservar a sua imagem.
À saída, Saldiva vaticinou: “Se os médicos, os alunos e todos os profissionais de saúde não souberem se respeitar, vai ser difícil ‘mudar a chave’ e tratar melhor o paciente”. Quem se acostumou a ser tratado como saco de batata em corredores de hospitais sabe do que ele está falando.
A desistência, àquela altura, deixava claro quem vence o embate em um país que se nega a lidar com o próprio presente, como atesta o cinismo dos envolvidos no caso da universidade, e com o próprio passado, como atestam as resistências sobre os trabalhos das comissões da verdade sobre a ditadura civil-militar - para ficar apenas em um exemplo. Em um caso como o outro, a história é construída na base dos panos quentes. Não é estranho, portanto, que o contraditório seja violentado até em marchas das famílias pela suposta liberdade. A ignorância é apenas a patente mais visível de nosso cinismo fundador: o que constrói a reputação de pessoas de “bem” – os que pagam advogados para abrilhantar consciências, reputações e silêncios.
No filme, a transcendência buscada pela personagem é estraçalhada pelos cadeados e âncoras cravados no chão. Mas o chão, escreveu Manoel de Barros, não quer ser olhado por pessoas razoáveis. Quer ser olhado de azul. O risco, por aqui, é tropeçar em reputações envernizadas e cadáveres insepultos.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

DESVARIO DAS ESCOLAS DE ELITE: Estupros e lei do silêncio: a opressão machista na Faculdade de Medicina da USP, A CONTROVÉRSIA ENTRE A "QUALIDADE" E A CRUELDADE!

Divulgando de YAHOO! NOTÍCIAS...

BLOG DA LAURA

Estupros e lei do silêncio: a opressão machista na Faculdade de Medicina da USP

Reportagem da excelente Tatiana Merlino e de Igor Ojeda para o site Ponte Jornalismo mostra como uma rotina de estupros, humilhações, violências sexuais diversas, castigos fisicos, machismo, racismo e discriminação social instalou-se em uma das escolas mais disputadas do vestibular da Fuvest, a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Ressalte-se que se trata de escola gratuita, sustentada pelos impostos recolhidos no Estado de São Paulo, e que deveria formar os profissionais mais ciosos do cuidado com a vida humana, os médicos.
Investigação do Ministério Público sobre oito denúncias de estupro (de calouros e calouras) cometidas nos últimos anos mostra, entretanto, que a primeira lição aprendida pelos ingressantes na Faculdade de Medicina é: respeite a lei do silêncio. Se agredido, não denuncie. Se presenciar uma agressão, cale-se.
Pois aos futuros médicos tem-se ensinado o modus operandi do corporativismo mais cruel: o que acoberta criminosos para, supostamente, proteger o bom nome da categoria e, no meio dela, sua elite: os egressos da Faculdade de Medicina da USP.
"Muitas das garotas têm menos de 20 anos. A maior parte delas é branca, de família de classe A ou B. Estão felizes por realizar um sonho. Apreensivas pelos desafios que enfrentarão nos anos seguintes. Assustadas com o novo ambiente e os rostos desconhecidos.
São reunidas em círculo. Em volta, outro círculo, de garotos igualmente brancos, igualmente nascidos em famílias ricas ou de classe média alta. Mas são mais velhos [veteranos]. Intimidadores. Ordenam que todas gritem “bu”. Elas obedecem:
– Bu! Bu! Bu! Bu! Bu! Bu!
Um coro alto de vozes masculinas, a dos garotos em volta das garotas, abafa as vozes femininas e ressoa pelo ambiente:
Buceta! Buceta! Buceta eu como a seco! No cu eu passo cuspe! Medicina é só na USP!”
(Tatiana Merlino e Igor Ojeda, em reportagem publicada no dia 11/11)
O grito de guerra infame integra uma das primeiras atividades do trote na faculdade. A barbárie evolui para a apalpação, a forçação de barra por um beijo, dedos e línguas, calcinhas arrancadas, chegando aos estupros e violações. Tudo isso tendo como combustível hectolitros de álcool, energizantes e drogas de todos os tipos, consumidos abertamente em “festas tradicionais” promovidas por entidades igualmente tradicionais da USP, como a Associação Atlética Acadêmica Oswaldo Cruz.
A situação só veio a público graças à coragem de um grupo de jovens que ousou romper o medíocre, covarde e criminoso pacto de silêncio.
Na quarta-feira (12/11), como se tivesse sido colhida de surpresa pelas denúncias, a direção da Faculdade de Medicina anunciou a criação de um centro de direitos humanos para dar assistência jurídica e psicológica às “vítimas de agressões sexuais, machismo, racismo e homofobia”.
E prometeu que o centro “estará atuando em até 40 dias”.
Como se o desespero e a sede de Justiça das vítimas pudesse esperar!
Falemos às claras: a faculdade está jogando para a torcida. Todas as vítimas contaram que denunciaram as violências sofridas aos diversos órgãos da faculdade. Todas relataram que esta esteve sempre mais preocupada em abafar os casos do que em apurá-los e punir os responsáveis.
A verdade é que, com o escândalo armado pelos denunciantes, a hierarquia universitária teve de tomar uma medida. Mas, como dizia a raposa da República Velha, fez isso “nem tão devagar que parecesse afronta, nem tão depressa que parecesse medo!”.
A Faculdade de Medicina da USP já teve dias muito melhores.
Fundada por Arnaldo Vieira de Carvalho, foi a primeira escola pública de nível superior de São Paulo a permitir explicitamente em seu regulamento o ingresso de mulheres.
Outra política de inclusão que mostra como estava muito à frente de seu tempo: a Faculdade de Medicina tinha, na sua fundação, alunos cotistas. Dez por cento das vagas destinavam-se à matrícula de estudantes pobres. (Hoje a faculdade não tem nenhum cotista, como, aliás, acontece em toda a USP.)
Na foto amarelada da primeira turma de formandos, de 1918, veem-se duas jovens pioneiras, Delia Ferraz e Odette Nora, fotografadas entre 36 homens. Não há registros de mulheres na segunda turma e, durante muitos anos, a presença feminina ainda foi bastante minoritária.
Isso mudou. O anuário estatístico da USP de 2013 mostra que as mulheres já são mais da metade (52,2%) de todos os alunos da graduação. Os homens ocupam 48% das vagas.
As mulheres passaram no hiperconcorrido vestibular e entraram no território marcadamente masculino. A cultura da diversidade, entretanto, ainda não conseguiu furar o bloqueio do machismo lá entrincheirado.
Não resta dúvida de que a inação da hierarquia universitária ajudou os predadores em sua carreira de violências. Enquanto várias alunas, homossexuais e pessoas mais pobres eram humilhadas, boa parte dos professores (62% dos quais são homens) preferiu enfiar a cabeça em um buraco a tomar alguma atitude.
A categoria médica ja teve entre seus quadros gente tão inspiradora quanto o cardiologista Euryclides de Jesus Zerbini (pioneiro dos transplantes) e Luiz Hildebrando Pereira da Silva (pesquisador e médico sanitarista). Já criou um dos maiores sistemas públicos de Saúde do Mundo, por intermédio do SUS, que universalizou o atendimento médico, financiado com recursos da União, dos Estados e dos Municípios.
Agora, tem de se haver com o vexame de ter acobertado denúncias gravíssimas de estupros, cometidos por uma minoria que mancha a reputação da Casa de Arnaldo.
Roger Abdelmassih fazendo escola?