Misoginia
e o Impeachment de Dilma- por Cynara Menezes:
O
auge da misoginia com a presidenta da República viria em 2014, na abertura da
Copa, onde um coro de “Dilma, vai tomar no cu”
explodiu no estádio, diante do mundo inteiro, para nossa vergonha. Na época, a
repórter Laura Capriglione noticiou que o xingamento foi puxado pelos que
estavam no camarote, na chamada “ala VIP”. Entre “as mais entusiasmadas” era a
colunista social do jornal O Estado de S.Paulo, “que deve ter achado muito
fina, elegante e sincera a modalidade de protesto”. Na posse de Dilma para o
segundo mandato, Miriam Leitão e Cora Rónai, do jornal O Globo, se divertiram
zombando do vestido e até do “andar” da presidenta.
Dilma
era xingada com termos machistas nos protestos e nas redes sociais: “quenga”,
“puta”, “vaca”. Jamais a voz de uma mulher jornalista em posição de destaque na
imprensa comercial se ergueu para apontar a misoginia em torno do impeachment.
Nem mesmo quando começaram a aparecer adesivos para colocar no tanque do carro
com a imagem da presidenta, uma senhora com mais de 60 anos, de pernas abertas.
Silêncio.
Quando,
naquele domingo vexaminoso na Câmara, Jair Bolsonaro se pronunciou em favor do
impeachment, dedicando o voto ao coronel Brilhante Ustra, “o terror de Dilma
Rousseff”, o silêncio se repetiu. Não houve, por parte das mulheres da grande
mídia, nem um pingo de sororidade com a mulher que ocupava o Planalto e cujo
algoz nos porões da ditadura estava sendo homenageado.
Parece
incrível, mas são as mesmas jornalistas que agora mostram indignação e surpresa
com esta triste figura ocupando o lugar que já foi de Dilma. “Onde está a
reação das instituições?”, bradava a colunista Vera Magalhães, do Estadão,
sobre as insinuações de Bolsonaro em relação à repórter Patricia Campos Mello,
da Folha, atacada pelo mitômano Hans River na CPMI das Fake News
Nem
parecia a mesma Vera que chamava de “mimimi” as queixas de mulheres da esquerda
sobre machismo e que participou ativamente do golpe que fragilizou as
instituições democráticas do país –e agora cobra “reação delas”. Que
instituições, querida?
Thais
Herédia, da CNN Brasil, se espantava: “Como chegamos até aqui?” É sério que
jornalistas com anos de profissão nas costas foram tão ingênuas para não prever
como seria um governo Bolsonaro, que já dava mil pistas de quem era durante os
28 anos em que foi parlamentar? Até a Madonna sabia e vocês não?
Agora
foi Patricia, antes foram Dilma, Maria do Rosario, a mulher do Macron… Mas
precisou Bolsonaro atacar uma profissional da “grande” imprensa e atingi-las no
que lhes é de mais caro, o corporativismo, para que estas mulheres enxergassem
o óbvio: machismo não é mimimi. Qualquer uma de nós, independentemente de
posição política, pode se tornar vítima da misoginia instalada no governo,
resultado lógico de um golpe misógino que as jornalistas de direita apoiaram,
diretamente ou por omissão.
O
mais absurdo dessa história é que, alvo do preconceito de gênero, as
jornalistas de direita continuam a se insurgir contra… as feministas. “Cadê as
feministas?”, provocam, cada vez que sua indignação seletiva é ativada por
algum sinal de machismo, mas apenas no campo adversário, a esquerda. Como se o
machismo, exatamente como defende a esquerda, não fosse estrutural da
sociedade.
Parem
de cobrar das feministas ação contra o machismo que vocês mesmas ajudaram a
levar ao poder. Nós sempre estaremos lá, do lado das vítimas, nunca dos
algozes. Não é porque mulheres se alinharam a machistas para golpear outra
mulher que iremos abandoná-las quando se tornarem vítimas deles. Mas não deixa
de ser uma lição e tanto.
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