O cenário é mais ou menos esse: amigo formado em comércio
exterior que resolveu largar tudo para trabalhar num hostel em Morro de São
Paulo, amigo com cargo fantástico em empresa multinacional que resolveu pedir
as contas porque descobriu que só quer fazer hamburger, amiga advogada que
jogou escritório, carrão e namoro longo pro alto para voltar a ser estudante,
solteira e andar de metrô fora do Brasil, amiga executiva de um grande grupo de
empresas que ficou radiante por ser mandada embora dizendo “finalmente vou
aprender a surfar”.
Você pode me dizer “ah, mas quero ver quanto tempo eles vão
aguentar sem ganhar bem, sem pedir dinheiro para os pais.”. Nada disso. A onda
é outra. Venderam o carro, dividem apartamento com mais 3 amigos, abriram mão
dos luxos, não ligam de viver com dinheiro contadinho. O que eles não podiam mais
aguentar era a infelicidade.
Engraçado pensar que o modelo de sucesso da geração dos
nossos avós era uma família bem estruturada. Um bom casamento, filhos bem
criados, comida na mesa, lençóis limpinhos. Ainda não havia tanta guerra de ego
no trabalho, tantas metas inatingíveis de dinheiro. Pessoa bem sucedida era
aquela que tinha uma família que deu certo.
E assim nossos avós criaram os nossos pais: esperando que
eles cumprissem essa grande meta de sucesso, que era formar uma família sólida.
E claro, deu tudo errado. Nossos pais são a geração do divórcio, das famílias
reconstruídas (que são lindas, como a minha, mas que não são nada do que nossos
avós esperavam). O modelo de sucesso dos nossos avós não coube na vida dos
nossos pais. E todo mundo ficou frustrado.
Então nossos pais encontraram outro modelo de sucesso: a
carreira. Trabalharam duro, estudaram, abriram negócios, prestaram concurso,
suaram a camisa. Nos deram o melhor que puderam. Consideram-se mais ou menos
bem sucedidos por isso: há uma carreira sólida? Há imóveis quitados? Há
aplicações no banco? Há reconhecimento no meio de trabalho? Pessoa bem sucedida
é aquela que deu certo na carreira.
E assim nossos pais nos criaram: nos dando todos os
instrumentos para a nossa formação, para garantir que alcancemos o sucesso
profissional. Nos ensinaram a estudar, investir, planejar. Deram todas as
ferramentas de estudo e nós obedecemos. Estudamos, passamos nos processos
seletivos, ocupamos cargos. E agora? O que está acontecendo?
Uma crise nervosa. Executivos que acham que seriam mais
felizes se fossem tenistas. Tenistas que acham que seriam mais felizes se
fossem bartenders. Bartenders que acham que seriam mais felizes se fossem
professores de futevolei.
Percebemos que o sucesso profissional não nos garante a
sensação de missão cumprida. Nem sabemos se queremos sentir que a missão está
cumprida. Nem sabemos qual é a missão. Nem sabemos se temos uma missão. Quem
somos nós?
Nós valorizamos o amor e a família. Mas já estamos tranquilos
quanto a isso. Se casar tudo bem, se separar tudo bem, se decidir não ter
filhos tudo bem. O que importa é ser feliz. Nossos pais já quebraram essa para
a gente, já romperam com essa imposição. Será que agora nós temos que romper
com a imposição da carreira?
Não está na hora de aceitarmos que, se alguém quiser ser CEO
de multinacional tudo bem, se quiser trabalhar num café tudo bem, se quiser ser
professor de matemática tudo bem, se quiser ser um eterno estudante tudo bem,
se quiser fazer brigadeiro para festas tudo bem!
Afinal, qual o modelo de sucesso da nossa geração?
Será que vamos continuar nos iludindo achando que nossa
geração também consegue medir sucesso por conta bancária? Ou o sucesso, para
nós, está naquela pessoa de rosto corado e de escolhas felizes? Será que
sucesso é ter dinheiro sobrando e tempo faltando ou dinheiro curto e cerveja
gelada? Apartamento fantástico e colesterol alto ou casinha alugada e horta na
janela? Sucesso é filho voltando de transporte escolar da melhor escola da
cidade ou é filho que você busca na escolinha do bairro e pára para tomar
picolé de uva com ele na padaria?
Parece-me que precisamos aceitar que nosso modelo de sucesso
é outro. Talvez uma geração carpe diem. Uma geração de hippies urbanos. Caso
contrário não teríamos tanta inveja oculta dos amigos loucos que “jogaram
diploma e carreira no lixo”. Talvez- mera hipótese- os loucos sejamos nós, que
jogamos tanto tempo, tanta saúde e tanta vida, todo santo dia, na lata de
lixo."
(Ruth Manus)
Simples assim!
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