FEMINISMO
SALETE Gorett
Salete
é minha amiga pessoal, mestre em direito, doutora em gênero e feminismo. Penso
como ela: “A dominação masculina (também conhecida como patriarcado) é tão
estrutural, tão profunda, tão nefasta e tão escrota, que consegue articular uma
diversidade de vozes, discursos, interesses e sujeitos sociais numa mesma
direção e propósito, qual seja: a manutenção do status quo de gênero e dos
privilégios dos homens, independente de serem eles anônimos ou famosos,
sobretudo, quando apontados como violadores dos direitos humanos das mulheres,
em contextos de acusações falsas ou comprovadamente verdadeiras. O trunfo
patriarcal é que, a priori, os homens tem, historicamente, merecido respeito e
credibilidade pelo simples e só fato de serem homens, ao passo que as mulheres
tem menor valor social em distintos contextos culturais. Ponto. É por isso que
mesmo num país onde há elevadíssimos índices de violência de gênero
(especialmente feminicídios) e inúmeros crimes sexuais com autoria e materialidade
COMPROVADAS contra mulheres e meninas, há quem tente (inclusive com argumentos
jurídicos, invocados como tecnicamente neutros) tornar natural e até
"prudente" a "garantia" da inocência masculina antes e
acima de qualquer coisa, ao passo em que virou regra suspeitar e até detonar
com qualquer mulher que ouse denunciar qualquer homem por práticas violentas
e/ou abusivas. E, se neste momento as vozes que se levantam (pagas ou não) são,
em sua maioria, em prol do "menino Neymar" [e todas são eloquentes e
midiaticamente avaliadas como merecedoras de crédito, independente das provas
ou do desenrolar de um eventual processo criminal], isto só corrobora o quão
eficiente são os artifícios patriarcais e suas infinitas trampas e
possibilidades, que visam sempre confundir até mesmo os/as mais ferrenhas
opositores/as deste sistema de opressão/exploração de vidas, corpos e vontades
femininas. Eis porque todos agora falam e creem em convicções, até mesmo os/as
que outrora questionavam este absurdo "meio de prova" processual. E
isso explica porque o próprio Neymar, o pai de Neymar, o PRESIDENTE DA
REPÚBLICA que também "põe a mão no fogo por Neymar", o canal de
televisão que se coloca a favor de Neymar, os fãs de Neymar, os amigos de
Neymar, a advogada feminista que defende Neymar e até os ex-advogados da mulher
que acusa Neymar consideram que estão todos antecipadamente certos, já que
"a verdade social e real está com eles", independente do que será
provado posteriormente... A única dúvida que está sendo convertida quase que
num consenso nacional, é quanto à índole da mulher que está acusando Neymar,
pois sua palavra, sua imagem, sua vida pregressa, seus desejos e seus direitos
merecem ser questionados profundamente, antes que qualquer coisa, porque ela só
pode estar errada (e não há outra possibilidade, porque ela é uma mulher), como
todas as outras, inclusive as vítimas dos crimes sexuais que só foram
descobertos porque houve flagrante delito, como os estupros ocorridos dentro
das casas de famílias tradicionais. Ponto. E embora eu não esteja afirmando que
há sempre uma "verdade única, absoluta e inquestionável" na palavra
de todas mulheres, o que está em discussão é a naturalização do julgamento
prévio das mulheres, o linchamento moral e as certezas absolutas em favor dos
homens, neste e em todos os demais casos. Ademais, apesar desta situação ter
maior visibilidade porque Neymar é um ídolo do futebol internacional, isto não
afasta a presença do privilégio de gênero em todas as outras situações de
denúncia de crimes sexuais, pois os tais privilégios masculinos também operam a
favor do José de Tal que anonimamente responde processo de estupro, inclusive
de vulnerável, nos mais recônditos municípios interioranos do Brasil, conforme
pude verificar em diversos casos que acompanhei como advogada de vítimas
durante anos e anos de advocacia feminista e libertária, sem qualquer arrego.
Isto dito, reafirmo que precisamos seguir enfrentando esta cultura patriarcal
antes que ela, articulada com as inúmeras ofertas e seduções capitalistas,
coopte mais pessoas que lutam, palestram e/ou advogam em defesa dos direitos
das mulheres...Sigamos!”