Divulgando...
CONTINUANDO...
Divulgando...
E
aí povo!
Dia
de Pensamento Inquieto! Continuamos com os textos anunciados na primeira
postagem. Os mesmos serão divididos em várias postagens pra facilitar a
leitura.
Obs.:
Lembrando que temos uma novidade! Se você estiver sem tempo para ler o texto, a
partir de agora disponibilizaremos um link para que você possa ouvir o texto
sintetizado em MP3 (Haverá alguns sotaques visto que são sintetizadores
estrangeiros)! O(s) Link(s) estará(ão) sempre entre o primeiro e o segundo
parágrafo do texto postado.
Degustem!
Como nosso país poderá aumentar a produtividade e
disponibilidade desses bens sofisticados (a televisão ou o microcomputador têm
que ser produzidos e utilizados, no caso do microcomputador como instrumento de
trabalho) e ao mesmo tempo pensar em ampliar o número de empregos?
Isso não é uma solução fácil de encontrar. É uma problematização que se pode
fazer, menos do que apontar soluções simples.
Há
uma enorme falta de discussão fora dos setores interessados, ou seja, aqueles
que trabalham com ciência e tecnologia, e que naturalmente advogam a
importância da sua função. Mas é uma questão tão séria que exige uma discussão política.
Um partido avançado como o PT, um partido em cima do muro como o PSDB, ou mesmo
um partido mais conservador como o PFL, tratam a tecnologia com rótulo. Se
pegarmos o que eles dizem sobre tecnologia, é mais ou menos a mesma coisa, o
que é mau. É sinal que eles não sabem
ler o que dizem, ou apenas um deles sabe o que diz, provavelmente o PFL.
Este é o problema. E os outros repetem sem saber o que estão falando.
Se tecnologia tem a ver com emprego, com
trabalho, é uma questão política. Mas não pode ser pensada apenas como
um bloqueio sindical, como os famosos ludistas que quebraram as máquinas,
muitas décadas atrás, para evitarem a substituição de sua mão-de-obra por elas.
Mas aquela era uma fase onde se passava da produção semi-artesanal e
industrial, organizada à guisa de um artesanato coletivizado, onde a força
motriz era minimamente usada para correias de transmissão fazerem alguns
movimentos repetitivos mecânicos para uma situação na qual passamos a ter grandes máquinas, resultando nas linhas de montagem que
são o paraíso do taylorismo e do fordismo. Onde o homem é governado pelo ritmo
da máquina, do homem que trabalha no tempo da máquina, situação
magistralmente descrita pelo gênio de Charles Chaplin em Tempos Modernos.
Não sei se alguns dos senhores teve
alguma experiência desse tipo, em alguma situação particular, ter o seu tempo governado por algo fora
de si, completamente, num ritmo muito acelerado. Isso se dá em alguns
jogos, que dão emoção, aflição; você tem que passar a bola e segurá-la. Mas ali
é um lazer, é um desafio que você está se impondo a si próprio. Imaginem os
senhores o dia inteiro fazendo uma coisa rotineira, que não tem a graça do
jogo, porque é sempre igual, no ritmo de uma esteira rolante.
Então a tecnologia, quando acaba a
esteira rolante, tem um dado ambíguo. De um lado, é muito bom que homens deixem
de fazer aquilo que o Carlitos simboliza com o tique nervoso de ficar fazendo
rodar uma chave de parafuso, chave inglesa ou lá o que se fosse. Por outro lado, é preciso ter a consciência
de que isso significa desemprego, se não houver um emprego novo. As ilhas
de produção, que hoje são usadas no lugar das linhas de montagem, são
agrupamentos de operários em torno de um objetivo onde há uma certa unidade.
Mas, voltando ao sistema semi-artesanal, não é bem assim porque há muita presença de informatização de
gerência, de ritmo, de um outro tipo de ritmo que é da competição do que cada
ilha poderá produzir mais do que a outra, se ganhar mais por causa disso.
Portanto, tem aí um taylorismo
escondido, quando os deslumbrados da tecnologia falam do fim do taylorismo e do
fordismo. Talvez devessem dizer melhor
um outro taylorismo, um outro fordismo, porque o ritmo das ilhas de produção
também é um ritmo severo, embora elas sejam, sem dúvida, mais humanizadas
que as linhas de montagem. Mas temos que lidar com essas coisas que estão aí. Os partidos, os sindicatos, acho que até a
CUT, pelo que eu saiba, estão bastante atentos, criando grupos de estudos com a
cooperação dos italianos, que são especialista em negociar, em pactuar a
entrada das tecnologias de acordo com a realidade social do país. São
questões muito concretas.
É assim que analiso a tecnologia, e não na venda da
ilusão de um mundo maravilhoso onde todos seremos felizes porque teremos coisas
de eletrônica penduradas por todos os lados. Talvez seja necessário termos
menos coisas eletrônicas para sermos mais felizes. E temos que pensar a
dose das coisas eletrônicas, não deixando que o capitalista, preocupado com a
maximização da sua margem de lucros, faça isso por nós. Se desistirmos de nos apropriarmos, como
totalidade, dos meios de produção, porque isto não deu certo onde foi feito,
pelo menos, não dei certo para certas coisas, mas deu para todo mundo comer e
se vestir. E, lamentavelmente, para fazer bomba atômica e foguetes para meter
medo nos americanos, deu. Os americanos tinham enorme medo dos foguetes
soviéticos. Tanto medo que eles nem dormiam de noite. Faziam abrigo debaixo das
casas. Então, para isso, deu. Para fazer bombas, comida, calçados, mas não deu para
muita coisa que a sociedade, uma vez satisfeita a sua base de necessidades
essenciais, demanda. E talvez, acima de tudo, não deu porque se criou um
autoritarismo insuportável.
O que isso tem a ver com a
tecnologia é outro problema. Até para ilustrar essa questão. Logo que houve o
festival de países do Leste Europeu que se converteram ao capitalismo com muita
alegria, fizemos no Fórum da Ciência e Cultura da UFRJ, um debate com alguns
alemães, da Alemanha Ocidental, que estavam aqui através de um órgão de
cooperação técnico-alemã. E foi curioso que um deles falava o seguinte: “que
absurdo que é na Alemanha Oriental – dizia ele – imagine que, em plena hora do
expediente, o que se via? Operário na rua! Até de macacão, fazendo compras.
Imagine operário fazendo compras na hora do expediente!” Quer dizer, na
imaginação dele, as pessoas ficam mais felizes presas dentro das fábricas. Como
ficam, de fato! Quem entra numa fábrica, ou num guichê de banco, pelo lado de
dentro, vê que o sujeito está preso naquilo e que é a coisa mais maçante da
vida o que ele faz ali. É uma prisão.
Então, há um engodo gigantesco no fato de que nós só temos as vantagens nessa
coisa em que nós vivemos. Não. Há muitas desvantagens. É que alguns ficam com muitas vantagens e as
desvantagens são distribuídas, socializadas para a grande maioria. E
como nós não estamos nela, isso fica bom para nós.
Mas
não é verdade que tudo o que foi feito através do sistema de planejamento
daqueles países fosse negativo. Mas foi insuficiente, de fato, por várias razões, talvez
menos tecnológicas do que políticas. Agora, temos consciência de que
não é essa a solução que nos empolgaria mais, Não teríamos o objetivo, talvez
maior da nossa vida, de reproduzir um exemplo que tem suas limitações bem
balizadas historicamente. Porém, temos
que pensar coletivamente que tipo de desenvolvimento e que mix tecnológico
podem levar o Brasil a uma sociedade mais equilibrada. Isto é uma obrigação
nossa.
Pensar
na tecnologia desta forma significa discutir com as multinacionais a introdução
da automação, em que ritmo, e talvez até obrigando-as a fazerem investimentos
em setores que absorvam mão de obra. Porque o que acontece é que, em geral,
o tipo de serviço que é gerado pela tecnologia mais avançada não se reproduz
nos países como o Brasil. É óbvio que quando você substitui o trabalho da
esteira rolante com muita participação de operários por uma máquina
automatizada, você tem o problema da máquina, o programador dos computadores, o
‘bolador’ dos softs que são implantados permanentemente, enfim, há um trabalho
intelectual que vem atrás. Mas a grande
parcela dele não é feita nos países como o Brasil, que têm uma infraestrutura
educacional muito pior, que têm condições de reprodução dessa tecnologia muito
mais precárias, e sai caro.
Então,
é muito mais fácil que as grandes multinacionais, ao implantarem a tecnologia
avançada no Brasil, desloquem empregos na produção direta e gerem empregos na
concepção, fora do Brasil. Assim, é necessário uma política para que haja compensação. Para
que, se a empresa tem interesse no mercado brasileiro, ela tenha também essa
preocupação, de que se há um contingente empregado, a adoção de maquinas mais
eficazes deva ser pensada com expansão de certas atividades que possam gerar
empregos. Isto não é simples, porque nem nos países mais avançados
isto se dá com muita simplicidade.
Na agricultura brasileira ou mundial
se fez aquilo que se vê, por exemplo, fazendo uma viagem entre Uberlândia e
Uberaba: o deserto do campo. Viaja-se, talvez, cinco quilômetros seguidos sem
ver uma pessoa; só se vê soja. E de repente aparece um enorme trator ou uma
enorme colhedeira com algumas pessoas, pouquíssimas. A agricultura modernizou-se expulsando
boa parte de população rural para a periferia das cidades, para as favelas do
Rio de Janeiro, para as cidades-setélites de Brasília.
Hoje,
estamos fazendo a segunda expulsão, de dentro das fábricas. Isto precisa
ser pensado com muito cuidado. Senão, estamos gerando uma sociedade inviável, ou uma
sociedade que será, fatalmente, a mesma sociedade da droga. Eu ouvi
no Peru, dentro do Ministério das Relações Exteriores, num seminário, de uma
autoridade do Ministério, falando dentro do Ministério, que não se podia combater a droga radicalmente
no Peru porque era o grande elemento de exportação que o país tinha, muito
valorizado. Cocaína é o melhor produto do Peru e da Colômbia.
É uma realidade! Se não pensarmos
muito naquilo que um país como o Brasil tem pelo futuro, que dose, que mix
tecnológico, que projeto para o país deve ser viabilizado – como combinar as
possibilidades que a ciência oferece através da tecnologia para a produção com
a necessidade de arregimentar pessoas para o trabalho, para os empregos,
estaremos no caminho que levou a essa situação. E não estamos muito
longe disso.
Trago a vocês, portanto, menos a
alegria da tecnologia, o pedido de mais verbas para nossa atividade, e muito
mais, num lugar que se propõe a um pensamento inquieto, essa preocupação: fujam
do ‘oba-oba’! Desconfiem de tudo que todos dizem! A unanimidade, geralmente, é
‘burra’. O bom-senso é melhor, às vezes, do que esses chamados paradigmas que
todos seguem sem saber bem por quê. Tecnologia, hoje, é um mercado com forte
componente desse tipo. Temos que gostar dela, ma lista de modernidades,
privatização, tecnologia, liberalismo... sem falar de fome, miséria,
desemprego, etc.
Obs.: Os negritos
itálicos são os destaques do texto original; os [ ], os negritos
e os negritos
vermelhos são destaques nossos.
SUGESTÕES
DE LEITURAS
O dilema da sociedade
tecnológica – Max Lerner. Vozes, 1971. Petrópolis.
Política de Ciência e
Tecnologia para a década de 90 – Vários autores, CEAD/Ed. UnB, 1989.